terça-feira, 4 de novembro de 2008

Um erro "íngricola"!!!

Aí estávamos nós, nas férias grandes, (quando elas eram mesmo grandes), nos campos da província, que tanto gostávamos de correr e percorrer.

A caminho do rio, (que nesse tempo tinha a água límpida que até se viam os peixes), para um mergulho no açude, apanhando a fruta das árvores e comendo-a directo, sem qualquer medo ao tratamento do sulfato, “caçando” uma rã aqui outra acolá, ou até para maior aventura uma cobra de água, lá íamos desfrutando tudo aquilo que não nos era dado em Lisboa, terra dos estudos.

Claro que, se apesar de tudo sabíamos distinguir uma maçã de uma pêra, um milho de um trigo, um estorninho duma rola, outros frutos, outras culturas, outros animais, revelavam-se mais difíceis de distinguir.

Também, tínhamos de “aprender” tudo no Verão e não nos esquecermos no resto do ano!

Mas até dava gozo chegar a Lisboa e por vezes ser gozado pelos outros como provincianos, mas depois nas aulas, quando se tratava das coisas práticas ligadas com a “ingrícola”, um tipo dar uma de conhecedor, até para além daquilo que os próprios professores conheciam realmente.

Pois bem, um dia os meus primos, (companheiros permanentes de férias), e eu, durante uma dessas deambulações pelos campos, deparámos com um campo carregadinho de saborosos melões, e que sabíamos pertencentes ao meu pai, pelo que “estávamos em casa”.

Logo tomamos a decisão de abrir um para experimentar e logo também se colocou a pertinente dúvida:
Serão melões, ou abóboras?

Os nossos conhecimentos “ingrícolas” não chegavam a tanto e então eu, como filho do proprietário, senti-me empossado na autoridade de poder dar umas ordens, que logicamente foram no sentido de experimentar a abrir um/uma e depois logo se via.

A primeira era obviamente uma abóbora e disso não restavam dúvidas, mas a sede e vontade de comer, a graça que tinha partir aqueles frutos numa pedra para ver o interior, e a certeza inabalável de que o meu pai com certeza ali teria melões, levou-me a continuar e “autorizar” que a busca do melão continuasse.

Passado algum tempo sem encontrarmos nenhum melão, parámos a procura, e foi então que nos deparámos com um campo de abóboras completamente devastado pela ignorância “ingrícola” de um bando de rapazes que tiveram de se render à evidência que passavam mais tempo em Lisboa, que na província.

Mas agora era preciso dar uma explicação ao verdadeiro proprietário, que para além de não ser pessoa que gostasse de mentiras, tinha umas mãos que pareciam umas pás.

Aí, os meus primos chegaram à brilhante conclusão de que sendo eu filho, me competia a mim arrostar com as consequências, já que eles tinham a noção de que a coisa também iria chegar aos ouvidos do pai deles e assim escusavam de levar duas vezes.

Pareceu-me justa a explicação e decidi então que eu sozinho iria explicar ao meu pai o inexplicável.

Quando cheguei perto dele e vi o seu olhar, do alto do seu metro e oitenta e cinco, percebi que embora ainda não tivessem sido inventados os telemóveis, a noticia tinha corrido célere e que ele já estava de posse de todos os dados da “façanha” do seu filho.

Perante esta constatação não hesitei e contei a verdade nua e crua, pois para além da “estragação“ feita, tive de reconhecer a minha incapacidade de conhecimento no campo da “ingrícola”.

Olhou para mim e deu-me um estalo, tentando controlar a sua força, mas que mesmo assim me levou de ventas ao chão.

Quando me levantei, olhou para mim com um ar muito sério, embora me tenha parecido também um pouco trocista, e disse:
«Levas um estalo, não por causa do estrago que fizeste, mas por não seres capaz de distinguir uma abóbora de um melão. Que vergonha!»

Voltou as costas e afastou-se de mim e eu ia jurar que o tremer das costas dele era porque se ia a rir de mim.

Não sei o que me doeu mais no momento, se o estalo, se a vergonha de não ser capaz de distinguir uma abóbora de um melão!!!
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Hoje, dia das eleições na grande América, veio-me ao pensamento esta história verdadeira, que se passou comigo, e escrevi-a com o gozo da comparação entre as eleições para o Presidente dos EUA e uma coisa tão simples e tão comezinha como esta.
Já agora, será que algum dos dois candidatos saberá distinguir uma abóbora de um melão, no campo.

10 comentários:

Tiago R Cardoso disse...

diga-se que preferi ler a tua historia do que falar das eleições.

Chego cansado do trabalho e é estes momentos de leitura na blogosfera que me dão prazer, estou cansado mas mais cansado estou de politicas...

Obrigado!

Anónimo disse...

Ora bem, eu nessa safava-me bem!
Na destrinça entre um melão e uma abóbora :)

Lá quanto ao McCain e ao Obama, já não sei ... mas olhe que era bem perguntado aos dois "ianques".

joshua disse...

Muito engraçado.

Abraço

Joaquim Alves disse...

Obrigado Tiago

Também me vou cansando da politica e se calhar por isso mesmo vou recordando tempos de infância em que esse assuntos não me incomodavam.

Abraço

Joaquim Alves disse...

Ferreira Pinto

Problema, (desculpas claro), é que o raio das abóboras ainda estavam verdes e por isso não se distinguiam assim tão bem dos melões para além de que eu era ainda um "infante".

Os gajos só sabem o que são watermelons...

Abraço

Joaquim Alves disse...

Joshua

Obriagdo.

Tão parco nas palavras...estou admirado...eheheh

Abraço

Peter disse...

Estou a rever-me nos campos do Alentejo, mas a minha cultura é superior.
Dá-me prazer exibir os meus conhecimentos e explicar que são melros e não corvos as aves que andam por aqui, e mais:

Que o que é preto e de bico amarelo é um macho e que o de cor acizentada, mas para o escuro e não tem bico amarelo, é uma fêmea.
Que o pardal que tem o peito com uma espécie de gravata castanha é um macho e o que não tem, é uma pardaloca, ou pardaleja.

E ficamos por aqui. Foram muitos e muitos quilómetros palmilhados com a minha fisga.

Abraço

joshua disse...

Caríssimo Amigo,

Estou à espera do meu segundo filho que está por menos que dias. Ainda desempregado e blogando como se isso me desse sustento, vou ficando cansado.

Ando exausto de tentar em tentativas e erros. Em breve voltarei tanto à abundância como ao fulgor dos meus comentários.

Aquele Abraço

Joaquim Alves disse...

Peter

Bem não batam mais no "ceguinho"!

Considero-me um provinciano com alguns conhecimentos do campo e tudo o que o envolve.
Era muito garoto na altura!

Mas deixo-lhe aqui então este lindissimo canto alentejano.

Quais, quais, oliveiras, olivais
Pintassilgos, rouxinóis,
Caracóis, bichos móis,
Morcegos, pássaros negros,
Tarambolas, galinholas,
Perdizes e codornizes,
Cartaxos e pardais,
Cucos, milharucos,
Cada vez há mais.

Abraço

Joaquim Alves disse...

Joshua

Um abraço forte e amigo.